7 de Abril de 2022
Desinfeção têxtil em processos de lavagem de roupa
Apesar de que a principal função de um processo de lavagem de roupa seja a eliminação das manchas e sujidades visíveis, a redução da contaminação microbiológica presente nos tecidos representa especial importância para garantir a diminuição dos microrganismos até níveis higienicamente seguros e assim evitar fenómenos de contaminação cruzada que atuem como vias de transmissão e contágio de doenças. Este aspeto tem grande relevância no sector hospitalar e geriátrico, para têxteis dirigidos a grupos de risco e com elevada presença de elementos corporais (restos de pele, sangue, fezes, urina, vómitos, …) de pessoas possivelmente infetadas.
Durante os últimos anos, a crescente consciencialização ambiental tem originado o desenvolvimento e implementação de programas de lavagem têxtil a baixa temperatura, para otimizar a sua eficiência energética. Porém, a diminuição da temperatura de lavagem carrega uma significativa redução da eficácia antimicrobiana do processo.
Para conseguir que o processo de lavagem de roupa reduza os níveis de contaminação microbiológica a níveis higienicamente seguros, é imprescindível dispor de um amplo conhecimento dos mecanismos de desinfeção aplicáveis nos processos de lavagem têxtil, que permitam aplicar novos enfoques compatíveis com as atuais tendências de poupança energética, necessários para garantir a sustentabilidade ambiental do processo.
Processos de lavagem de roupa com efeito desinfetante.
Para recuperar as condições higiénicas de um tecido contaminado, evitando que possa atuar como foco de contágio e transmissão de doenças, os programas de lavagem de roupa devem desenhar-se especialmente para esta finalidade. O efeito desinfetante de um processo de lavagem conseguir-se-á com uma adequada combinação dos seguintes três parâmetros: Temperatura, Tempo e Ação Química.
Conscientes da grande importância que supõe a higiene têxtil, os principais organismos sanitários internacionais (o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) de Estados Unidos, o European Centre for Disease Prevention and Control (ECDC) a nível europeu e a World Health Organisation (WHO) a nível mundial) têm publicado numerosos guias técnicos para definir os requerimentos necessários para garantir uma adequada desinfeção têxtil durante um processo de lavagem. Estes organismos coincidem em que a desinfeção têxtil deve realizar-se através da aplicação de programas de lavagem que incluam algum dos seguintes mecanismos:
- Desinfeção Térmica.
- Desinfeção Termoquímica:
- Em fase de lavagem.
- Em fase independente de descontaminação.
Desinfeção Térmica.
O processo de desinfeção térmica ou termo desinfeção permite conseguir a redução da carga contaminante dos tecidos através da combinação de condições adequadas de Temperatura (alta) e Tempo, durante uma ou várias etapas do processo de lavagem.
As condições através das quais se consegue a termo desinfeção têm sido perfeitamente estudadas e definidas pelos organismos sanitários internacionais mencionados anteriormente, estabelecendo as seguintes:
- Segundo o CDC, a desinfeção térmica consegue-se com uma temperatura mínima de 71ºC e um tempo mínimo de 25 minutos.
- Segundo o ECDC, a desinfeção térmica consegue-se com uma lavagem a temperatura elevada (90ºC) acrescentando um detergente.
- Segundo a WHO, a desinfeção térmica consegue-se com detergente ou desinfetante a uma temperatura de 70ºC durante pelo menos 25 minutos.
A nível operativo, num processo de lavagem têxtil, a termo desinfeção realiza-se habitualmente na fase de lavagem, dosificando um detergente adequado para altas temperaturas. Adicionalmente, quando é necessário obter um efeito de branqueamento dos tecidos, a própria fase de lavagem se utiliza também como fase de branqueio, combinando o detergente com um agente branqueante químico oxigenado. Em elevadas temperaturas de uma fase de termo desinfeção, como branqueantes químicos utilizam-se libertadores de oxigénio ativo, como a água oxigenada (peróxido de hidrogénio) ou o percarbonato de sódio. Estes ingredientes, graças à sus capacidade oxidante, permitem adicionar ao processo um efeito desinfetante adicional por ação química.
Desinfeção Termoquímica.
Para aquelas situações em que não se podem alcançar temperaturas superiores a 70- 71ºC, devem implantar-se programas de lavagem que incorporem um agente antimicrobiano que complemente o efeito desinfetante obtido pelas condições de temperatura e tempo de contacto. A desinfeção termoquímica consiste na combinação de Temperatura, Tempo e Ação Química.
De acordo com a fase do processo de lavagem em que se realiza a ação química complementar, podemos diferenciar os seguintes mecanismos de desinfeção termoquímica:
Em fase de lavagem/branqueio
A desinfeção consegue-se através da combinação de Temperatura (média), Tempo e Ação Química durante a fase de lavagem/branqueamento, aproveitando a ação química desinfetante trazida pela capacidade oxidante do branqueante químico utilizado no processo.
Ainda que a principal função dos branqueantes químicos no processo de lavagem seja atuar como detergentes frente a manchas sensíveis a oxidantes (tais como chá, café, etc.), a sua grande capacidade oxidante torna-os especialmente eficazes na eliminação de microrganismos, atribuindo um efeito desinfetante ao processo.
Entre a grande variedade de oxidantes químicos atualmente utilizados em processos de lavagem a temperatura média (entre 40 e 60ºC) diferenciam-se:
- Branqueantes Oxigenados, tais como:
- Ácido peracético
- Percarbonato de sódio (ativado com TAED, para conseguir efeito a baixas temperaturas)
- Perácidos orgânicos, como o ácido ftaloimidoperoxihexanoico (PAP)
- Branqueantes Clorados: habitualmente à base de hipoclorito de sódio.
Todos estes compostos químicos estão devidamente notificados como ingredientes ativos biocidas na normativa europeia estabelecida pelo Regulamento (UE) n.º 528/2012 relativo aos biocidas, em concreto, para usos destinados a desinfeção de tecidos (tipo de produto PT2).
Em fase independente de descontaminação
No caso de temperaturas insuficientes para conseguir o efeito de desinfeção termoquímica com os compostos branqueantes utilizados na fase de lavagem/branqueio, a desinfeção têxtil pode realizar-se numa fase independente de descontaminação, através da combinação de Temperatura (Baixa), Tempo e Ação Química fornecida por um produto biocida específico, o qual deve estar devidamente registado como desinfetante PT2 segundo a normativa europeia de biocidas ou a normativa estatal equivalente.
Apesar de existir uma grande variedade de princípios ativos biocidas para conseguir o efeito de desinfeção têxtil a baixas temperaturas, entre os mais utilizados atualmente, cabe destacar os amónios quaternários, graças ao seu amplo espetro desinfetante frente a todo tipo de organismos, baixa sensibilidade a sujidades presentes no processo e o seu bom perfil ecotoxicológico.
O processo de desinfeção realiza-se a baixas temperaturas (abaixo de 40ºC), numa fase independente, posterior às fases de lavagem e oxidação, para garantir que os tecidos estão já limpos e assim obter o máximo rendimento do produto desinfetante.
Conclusões
Os processos de lavagem de roupa não só devem eliminar a sujidade presente no têxtil, devem também reduzir os níveis de contaminação microbiológica presente nos tecidos a níveis higienicamente seguros, rompendo cadeias infecciosas e assim evitar transmissão de infeções. Para conseguir o efeito desinfetante, é imprescindível dispor de um amplo conhecimento dos mecanismos de desinfeção a aplicar nos processos de lavagem de roupa e assim selecionar a ótima combinação de temperatura, tempo e ação química.
Devido à grande variedade de microrganismos existentes e a sua diferente sensibilidade frente às condições de desinfeção (especialmente temperatura e ação química), para conseguir o efeito biocida desejado frente aos organismos a controlar, é recomendável ajustar as condições do processo (tempo, temperatura e concentração do agente desinfetante utilizado) tomando como referencia os dados disponíveis dos estudos de eficácia biocida (normalmente normas EN) frente aos microrganismos objetivos (bactérias, vírus, fungos, levaduras, etc).
Referências bibliográficas:
(1) Centers for Disease control and Prevention (CDC). Guidelines for Environmental Infection Control in Health- Care Facilities. Updated July 2019. [Data de consulta: 14 setembro 2020]. Disponível em:
https://www.cdc.gov/infectioncontrol/guidelines/environmental/index.html
(2) Centers for Disease control and Prevention (CDC). Disinfection and Sterilization Guideline. Updated May 2019. [Data de consulta: 14 setembro 2020]. Disponível em: https://bit.ly/2VKyfj7
(3) European Centre for Disease Prevention and Control (ECDC). Interim guidance for environmental cleaning in non- healthcare facilities exposed to SARS-CoV-2. Updated February 2020. [Data de consulta: 14 setembro 2020]. Disponível em: https://www.ecdc.europa.eu/sites/default/files/documents/coronavirus-SARS-CoV-2-guidance-environmental-cleaning-non-healthcare-facilities.pdf
(4) Organização Mundial de Saúde (WHO). Infection prevention and control of epidemic- and pandemic- prone acute respiratory infections in health care. Updated 2014. [Data de consulta: 14 setembro 2020]. Disponível em: https://www.who.int/csr/bioriskreduction/infection_control/publication/en/
(5) Bockmühl DP, Schages J, Rehberg L. Laundry and têxtile hygiene in healthcare and beyond. Microb Cell. 2019 Jul 1;6(7):299-306. doi: 10.15698/mic2019.07.682. PMID: 31294042; PMCID: PMC6600116.
AUTOR: Carles Bertrana
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